A Venda é o Corpo do Negócio
- Carlos Alvim
- 27 de jun. de 2024
- 7 min de leitura
Empresas disputam participação de mercado em uma luta cada vez mais acirrada. Todas as “ferramentas” de marketing são postas à prova e as estratégias mais sofisticadas são desenvolvidas e aplicadas com o intuito de aumentar o faturamento e a lucratividade. Nesse cenário, o acompanhamento das tendências dos mercados deve correr “pari-passu” com a elaboração cuidadosa dos planos de vendas e da capacitação das equipes comerciais.
Fala-se, justificadamente, em cadeia de valor, valor agregado a produtos e serviços, diferenciais de atendimento, pós vendas, relacionamento com os clientes, pró-atividade das equipes, liderança, treinamento, “coaching” e toda uma série de propostas para desenvolvimento da performance e aumento da eficácia operacional. Como classificar essa necessidade plenamente justificada, de conhecimentos e habilidades a cada departamento da corporação promovendo entrosamento, coordenação e fluidez dos processos de comunicação interna é um desafio.
Todas essas propostas técnicas, (já verificadas e, portanto, dotadas de um embasamento prático) são perfeitamente válidas e, sem dúvida, muito úteis. Refletem a busca, por parte das empresas, de uma gestão cada vez mais profissionalizada, competitiva e com foco em resultados que sustentem a organização no tempo e garanta sua perenidade. Cada departamento da empresa está compromissado com o exercício de suas atribuições em nível de excelência, sem perder de vista os objetivos macro, o retorno aos acionistas e a sustentabilidade da corporação.
No entanto, mesmo com a melhor política de qualidade, os melhores profissionais na linha de produção, a melhor gestão financeira, as melhores práticas organizacionais, os recursos tecnológicos de última geração, se a empresa não vender, apresentará queda de faturamento, deterioração da lucratividade,clima organizacional deteriorado e fechará suas portas. Perenidade é vender cada vez mais para antigos e novos consumidores que, bem atendidos, transformam-se em “clientes”. “Cliente” não é que faz uma compra eventual e não volta, ser “cliente” significa uma regularidade de compras que assegura não só a lucratividade mas, também, a regularidade do fluxo de caixa.
Durante muito tempo a área comercial foi vista como um setor “menos nobre” na organização corporativa. A qualificação de vendedor não honrava ninguém. O departamento comercial era relevante, claro, mas funcionava na base do estímulo recompensa/punição e seus profissionais, além de facilidade de comunicação e relacionamento, “lábia” e motivação, não necessitavam comprovações de conhecimento, formação técnica específica, ou precisavam comprovara critérios de formação muito rígidos para sua contratação.
A profissão de vendedor era vista até com certo desprezo: “fulano não deu para nada e foi trabalhar com vendas”. A imagem era a do vendedor de enciclopédias, aquele que bate na porta e se intromete nas casas para com uma argumentação falaciosa convencer os incautos a comprarem algo que não querem e de que não precisam. Vendedor bom é aquele que vende pente para careca e geladeira para esquimó. Só fará uma venda...nunca terá clientes fiéis.
É claro que as habilidades necessárias para convencer um calvo a adquirir um pente ou um esquimó a comprar uma geladeira não são nada desprezíveis, mas será que essa habilidade oportunista e enganosa é aplicável nas condições de “hipercompetitividade” dos mercados de hoje? O departamento comercial é o “centro nervoso” da empresa. Se ele não desempenha bem sua função, anula os esforços dos demais. Vendas devem ser cuidadosamente planejadas e os profissionais dessa área devem ser meticulosamente bem formados. Sua atuação condiciona, diretamente, faturamento e lucratividade.
Os indicadores financeiros são informações de resultado, não instrumentos de aferição de performance operacional. Servem para a constatação do que deu certo ou errado na produção, no custeio, na logística, na gestão do patrimônio humano, na composição do mix de produtos ou serviços, nos esforços de vendas e, resumindo, na estratégia de marketing.
E para que as vendas aconteçam com frequência, regularidade e crescimento que as estratégias de marketing foram desenvolvidas. O marketing sempre foi um fator de propulsão das vendas e foi-se consolidando à medida que vender tornava-se cada vez mais difícil, as ofertas ficavam cada vez mais semelhantes e o número de competidores aumentava. O que sempre se buscou foi mais e melhores vendas, com maior valor agregado, clientes fiéis e constantes , aumentando o número e o volume de compras,para garantir a sustentabilidade das corporações.
Sustentabilidade sim, que se apóia em três pilares: responsabilidade ambiental (se o planeta for a pique, qualquer corporação vai junto e, além disso, imagem é fundamental), responsabilidade social também, porque se a organização não se mostrar socialmente responsável e inserida produtivamente na comunidade a que pertence, sofrerá rejeição e compromete seus resultados, além do compromisso ético que toda organização capaz de gerar valor deve respeitar. O terceiro pilar é a lucratividade. Sem resultados, nenhuma organização é capaz de exercer sua responsabilidade ambiental ou social. E lucratividade depende diretamente das vendas. Sem receita, nenhuma organização é capaz de comprometer-se com programas de responsabilidade ambiental ou social.

O marketing, tradicionalmente decomposto em seus “4 P’s”(McCarth, 1960) tende a difundir-se, cada vez mais, nas organizações como uma mentalidade, uma forma de se ver o negócio. Um departamento de P&D que pesquisa reais necessidades e preferências do mercado antes de desenvolver um novo produto, está imbuído da “visão de marketing”, está praticando marketing. O mesmo vale para um departamento financeiro que leva em conta as condições de competitividade do mercado, o valor agregado perceptível e o poder aquisitivo dos clientes, no momento da precificação. A escolha dos canais é cada vez mais uma decisão conjunta das áreas de logística e comercial.
Surge aqui um paradoxo: à medida que os departamentos de marketing das empresa tornarem-se mais “enxutos”, concentrados nas imagens das marcas e das corporações, voltados para a comunicação e seu planejamento, gestão da marca institucional e dos produtos/serviços, pós vendas (“SAC” inclusive) e relação com os administradores de serviços complementares de comunicação e promoção,seu escopo estará melhor definido crescerão em importância, terão foco mais direcionado e efetivo. A avaliação dos resultados será mais acurada e a eleição de indicadores de resultados para ações de marketing mais realista..
Marketing enquanto disciplina continuará a ser fundamental em todos os programas de educação para gestores, a mudança estará não nos conceitos, mas na variedade de profissionais treinados. Assim, haverá marketing para “P&D”, marketing para logística, marketing para finanças, marketing para vendas e marketing para gestão de pessoas. As capacitações em marketing não serão mais direcionadas exclusivamente aos profissionais da área, mas comporão um mosaico muito mais eficaz que divulgará conceitos, visão e cultura de observação do mercado.
Os gestores terão uma visão “para fora” provocadora de estratégias competitivas que partirão “de dentro”. Caberá aos profissionais de marketing a promoção dessa mudança cultural, aproximando-se dos diversos departamentos para disseminar a visão de “foco no cliente” ou, que é ainda mais atual e competitivo, a determinação do “foco do cliente” que justifica o argumento da parceria autêntica, afirmada na proposta: “cliente, diga quais são suas metas que eu vou me esforçar para que você as atinja ou ultrapasse, porque enquanto seu fornecedor, interessa-me o seu crescimento; crescendo sua organização, a minha cresce também, na relação fornecedor cliente consciente de cadeia de valor.
O profissional de vendas, hoje, é possuidor de um conhecimento multidisciplinar e de um ferramental sofisticado para obter sucesso e cumprir os objetivos estratégicos e metas das corporações. Deve ser capaz de planejar, desenvolver e aplicar estratégias e táticas que garantam ganho de competitividade, participação de mercado e lucro. Quando vender com lucro tornou-se cada vez mais difícil, pela concorrência provocativa de um grau de exigência cada vez mais alto dos consumidores, o marketing evoluiu.
Cresceu e dominou as empresa, não se vendia nada sem a especificação de “como”se venderia estipulada pelo departamento de marketing. Vendas, que gerou marketing pela necessidade de ganho competitivo, tornou-se serva de sua criação, e passou a pautar sua atividade nas ferramentas que o marketing desenvolvia. Curiosa inversão, o recurso auxiliar passou a orientar a atividade principal. Foi uma longa trajetória de aprendizagem que devolveu metodologias, conceitos e visões que, hoje, não podem ser ignoradas por nenhuma corporação e que estão ligadas a sua condição de sucesso.
Acontece que o “vender” mudou e que os recursos do marketing, outrora acessórios quase independentes da gestão comercial, difundiram-se pelos diversos departamentos da empresa debaixo do guarda-chuva do objetivo comum: vendas crescentes atreladas a uma carteira de clientes satisfeitos e fiéis que crescem em número e em volume de compras. Alguém conhece uma fórmula melhor para o crescimento sustentável de uma organização? Com segurança de faturamento e lucratividade ela pode, confortavelmente, voltar-se à responsabilidade ambiental e social, adequadamente “sustentadas”.
Vender era trocar bem ou serviço por dinheiro, garantindo a equivalência compensadora dos custos de produção de um bem ou da prestação de um serviço acrescida de um diferencial que constituía a”margem”, cuja repetição e operações quantitativamente representativas redundaram em um “lucro” capaz de motivar acionistas, colaboradores, bancos e investidores eventuais. Esse modelo de troca é conhecido como “venda transacional”. Uma vez que o consumidor considera o preço pago inferior ao benefício auferido, sente-se satisfeito e suspira um “valeu a pena”.
Toda corporação com estratégia e visão de futuro deve estar ciente de que o conceito tradicional de “vendas transacionais” foi substituído pelo atual de “vendas complexas” dentre as quais sobressai a “venda consultiva”, quando o vendedor torna-se assessor do cliente, substitui foco “no cliente” por conhecimento do negócio e do foco “do cliente”, afirmando-se parceiro com um argumento imbatível: “quero que você, cliente, cumpra suas metas e cresça, porque você crescendo, eu como seu parceiro e fornecedor crescerei também!”.
Essa parceria eficaz depende da compreensão de que as vendas tornaram-se complexas e de que uma simples oferta de produto ou serviço em troca de compensação monetária não se faz mais baseada na relação custo benefício primária: “se o benefício que essa compra me traz é maior que o custo que me acarreta, comprarei!” O mercado hoje demanda valores que não estão necessariamente nos produtos ou nos serviços, mas em uma oferta composta de produtos, serviços, relacionamento, parceria, foco e assessoria ao processo decisório da compra.
O profissional de vendas, hoje, para ser competitivo, deve conhecer profundamente sua corporação, cada produto e serviço do “mix” que ela oferta, deve conhecer o mercado, os clientes atuais e potenciais e os concorrentes. No “B2B” deve conhecer a cadeia de valor dos clientes atuais e potenciais e como sua oferta se encaixa nessa cadeia. Deve ter uma relação tão próxima com seus clientes que permita apoiá-lo em opções de produtos, decisões de compra e a partir de estudos setoriais, prever e antecipar demandas adotando uma atitude eminentemente pró-ativa.
Esse é um profissional de vendas, que alia conhecimentos diversos, que é capaz de articular ofertas baseadas em um excelente relacionamento em sua própria empresa com seus diversos departamentos, para compor ofertas adequadas que dependam de articulações com áreas diversas como produção, finanças, logística, para configurar a melhor oferta e oferecer “consultoria” ao processo decisório, o que transforma a venda transacional em “venda consultiva”.
Sempre considerando que “vendas” e “marketing” compõem uma oferta atrativa que aumenta as possibilidades de faturamento e lucratividade das empresas, cabe a colocação seguinte: dentre os recursos do marketing, a propaganda é o mais “glamouroso” e invasivo, a ponto de ser considerado “a alma do negócio”. Profundamente eficaz, especialmente no varejo, tal recurso provoca reconhecimento, alicerça percepções de marca e facilita o processo decisório de escolha
Negócios têm “alma”? Não existe consenso nem sobre a composição dos homens em corpo e alma, que dizer dos negócios? Agora, se o reconhecimento da existência a alma humana é controverso, não há dúvida alguma quanto à existência do corpo! E a verdade é que a venda é “o corpo do negócio”.
Caros Alvim.




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